Ela queria fazer uma comidinha que ainda não existisse. Algo diferente dos brigadeiros e dos cupcakes ensinados nos cursos de culinária que começou a frequentar quatro anos atrás.
A aventura de Maria Vilma Ferrato, consultora de TI por 44 anos, foi como a de um cientista em busca de uma nova ideia. O resultado são as delicadas mandalas comestíveis, que a profissional apresenta no Fartura São Paulo.
"Olhei uma flor e decidi fazer uma receita naquele formato", conta ela, sobre os biscoitos fininhos e coloridos, que prepara a partir de encomendas pelo site Flor Gourmet, para clientes na cidade de São Paulo.
Tal qual um pesquisador em seu laboratório, Maria Vilma encontrou, na cozinha do seu apartamento, a receita ideal durante sua 158ª tentativa -todas elas metodicamente anotadas num caderninho.
"A cada experiência, corria para o papel e anotava tudo o que havia feito. Quando algo dava certo, manifestava minha gratidão, voltava a experimentar e anotava", relata.
No início, desenvolveu uma massa para fazer uma flor tridimensional, com pétalas e recheio. A flor primeva ainda é produzida. "Mas eu levava uma hora para concluir seis flores com pétalas", lembra.
Do protótipo aos ajustes seguintes, moldaram-se os biscoitos que são o sucesso do negócio: feitos a partir de uma camada finíssima de massa, eles não têm glúten nem lactose, e quase nada de açúcar. "Coloco uma colher de açúcar para cada quilo de massa", revela. "Pelos meus cálculos, cada biscoito tem uma caloria."
Além da beleza dos formatos -são três flores diferentes, que para um de seus admiradores mais parecem mandalas, daí o nome-, os biscoitos são crocantes, leves e têm 12 sabores, entre eles cacau e avelã, mel, morango, gengibre e coco.
"A cada sabor, adapto um pouquinho a receita", segreda. "Se não tentasse aperfeiçoá-la, não teria chegado aos canudinhos", diz a doceira.
Ao assistir a uma reportagem sobre canudos de plástico pela TV, Vilma teve mais uma ideia. Horas depois, tirou do forno os primeiros canudinhos de biscoito. "Peguei um hashi, enrolei a massa dos biscoitos em torno dele, pus para assar."
O canudo comestível da Flor Gourmet, criado no início deste ano, faz sua estreia na edição paulistana do Fartura.
Relativamente grosso e feito a partir de adaptações da massa das mandalas (com menos açúcar ainda), não transfere sabor ao líquido, aguenta uma hora num copo de suco, refrigerante ou chá, e até duas horas mergulhado numa caipirinha, sem amolecer. "O fato de não conter glúten talvez seja a resposta para sua resistência", diz Vilma.
Uma alternativa para a recente batalha de restaurantes contra as versões tradicionais de plástico, poluentes e desnecessárias. "É um produto sustentável, numa embalagem reciclável, que não agride o ambiente", diz.
A doceira pretende, em sua barraca no Fartura, mergulhar um canudo em um copinho de cachaça e marcar a passagem do tempo. O experimento dividirá as atenções com a bandeja forrada de açúcar cristal, onde Vilma exibirá as mandalas para degustação.
Experiências, mesmo controladas, também dão errado. "Só quebrei a cara uma vez", lembra Maria Vilma. Foi quando encomendaram um biscoito azul. "A natureza não fornece alimento azul. E que sabor tem o azul?"
A investigação produziu resultados que não a agradaram. "Usei corante alimentício, a língua ficava tingida", lembra. Da tentativa e erro, ficou uma lição: "Jurei que a única cor que nunca mais vou usar na vida é o azul".
E, afinal, qual é a receita do biscoito? É segredo. "Vai meia dúzia de ingredientes, é bem simples", desvia.
Maria Vilma quer que os caderninhos continuem vivos nas mãos de seus dois filhos. "Preciso deixar isso para alguém."