Na soleira de uma porta perto da estação do metrô Anhangabaú, no Centro de São Paulo, William Gustavo Luciano Ribas de Alcântara dormia para curar a ressaca. Ao acordar e enumerar os sobrenomes, brincou: "É nome de príncipe".
Tem 22 anos e há seis mora na rua. Fugiu de casa, onde "rolava muita treta". Seu pai era usuário de crack. "Sabe esse pessoal que passa aí sem dar bom dia? Era assim em casa. Eu podia fazer de tudo para ser notado, e não era. Na rua, não me sinto invisível", diz.
Natural de Campinas, andou pelo acostamento da rodovia por 35 km para chegar a Jundiaí. De lá, pegou o trem para São Paulo.
William diz preferir as ruas do centro paulistano por conta da facilidade de conseguir comida. "Também é melhor para pequenos delitos", ri.
Gosta muito de caminhar durante a madrugada. Quando não tem ninguém na rua, diz, não há olhares tortos. "Você já fez isso? É uma paz."
Apesar de geralmente dormir próximo do mesmo grupo de pessoas, William acha que não existe amizade na rua. "Só tem gente que se interessa pelo que temos no momento. Pode ser dinheiro, droga, o que for. Quando você não tem mais essas coisas, eles desaparecem. E quando eles têm e você precisa, eles não te dão. Isso não é amizade." Na noite em que conversou com a reportagem da Folha, estava só.
Teve uma namorada há algum tempo, uma garota "que tinha casa e família". Arranjou um emprego como atendente em um restaurante e alugou um quarto para si. Quando o relacionamento terminou, largou tudo e voltou para a rua.
Para ele, seria mais fácil entrar na linha se estivesse acompanhado. "Sozinho, às vezes, não sei o que fazer. O caminho certo é trabalhar, voltar a estudar, ter minha casa. Acho que encontrando alguém é mais fácil ter força de vontade."
Estas reportagens foram produzidas pela equipe do 62º Programa de Treinamento em Jornalismo Diário da Folha, patrocinado pela Philip Morris Brasil.