Jaqueline Rodrigues Borges, 41, não vê os filhos há dois anos. Quatro meninos e quatro meninas, eles estão aos cuidados da sogra, na zona leste da cidade. Ela mantém contato por telefone, mas prefere não visitá-los. "Não quero que me vejam deste jeito", diz.
É ao caçula de cinco anos que Jaque, como gosta de ser chamada, destina o Bolsa Família que recebe mensalmente. "Não estou lá, né? Tenho que ajudar", afirma.
Já o benefício do atual companheiro, Careca, é todo gasto com drogas. "Crack, maconha, farinha, álcool", lista. O casal divide uma garrafa de cachaça enquanto conversa com a reportagem.
Os dois se conheceram na rua há um ano. "Pedi um cantinho na chuva. Só quando acordei vi o tamanho desse nariz", brinca Jaque, apontando para o nariz de Careca. Apesar do afeto, há uma razão pragmática por trás da união. "Quando tem homem acompanhando, os outros nem chegam perto", diz.
Para sobreviverem, pedem dinheiro na rua e limpam a carrocinha de um pipoqueiro. O serviço lhes rende cerca de R$ 15 por semana. Quando a situação aperta, diz Jaque, roubam um ou outro item do supermercado.
Também costumam ganhar sobras de um açougue próximo, assadas em uma churrasqueira improvisada debaixo do Elevado Presidente João Goulart. É lá, protegidos da chuva, que dormem.
Jaque abortou duas vezes nos últimos meses. Por causa de um mioma, tumor benigno que cria uma massa no útero, parece estar grávida de novo. Além disso, desenvolveu uma hérnia. Está na fila do SUS para operar.
A família já tentou interná-la em uma clínica de reabilitação, mas ela fugiu. "Eles te deixam xarope, te enchem de remédio. Não dá", diz.
Estas reportagens foram produzidas pela equipe do 62º Programa de Treinamento em Jornalismo Diário da Folha, patrocinado pela Philip Morris Brasil.