Capítulo 11
Giovanna, 23

'Eu tenho orgulho da pessoa que eu sou'

Travesti desde os 13 anos, Giovanna faz programa para pagar a injeção hormonal

Anna Satie Guilherme Guerra
São Paulo

Giovanna Treveli, 23, diz que evita gozar há mais de um ano. A razão não é religiosa, embora tenha formação evangélica; nem falta de companhia, já que tem vida sexual ativa.

O motivo é outro. Ela acha que há interferência no efeito das injeções de anticoncepcional feminino que toma de duas a três vezes por semana (quando a recomendação médica é de uma vez a cada 20 dias, no máximo). O objetivo é feminilizar o corpo, fazendo com que os pêlos do rosto caiam e os seios cresçam. Feminilizar, nesse caso, não significa fazer a cirurgia de redesignação sexual. Para ela, o pênis faz parte de quem ela é. "Eu tenho orgulho da pessoa que eu sou", diz.

Giovanna se considera travesti desde os 13 anos, quando começou a fazer programa. Hoje, ela cobra R$ 30 para fazer a "boca-baixa" (sexo oral) e R$ 80 para fazer penetração. Com esse dinheiro, compra as injeções anticoncepcionais.

"Fui para a rua porque não conseguia emprego", conta, ao falar das dificuldades de conseguir trabalho. Giovanna tem ensino médio completo e curso técnico em secretariado, área na qual trabalhou formalmente por pouco tempo. Já foi presa por roubar produtos para o cabelo de uma farmácia e por levar uma bolsa Louis Vuitton de um shopping de classe alta. Por esse último crime, cumpriu dois anos e cinco meses de prisão.

Foi lá que ela conheceu o amor da sua vida, Daniel. Hoje, Giovanna aguarda que ele saia da cadeia para reatar o relacionamento. Enquanto isso, existe um companheiro atual. "É muito ruim não ter com quem ficar", diz.

Giovanna está há seis meses na rua, seu período mais longo. Antes, costumava passar alguns dias fora até que a mãe viesse buscá-la. Mas dessa vez a garota recusa a proposta sob o argumento de que é independente e de que "não gosta de lavar prato".

Não vê os albergues para desabrigados como opção para ela. Ao dividir espaço com alguém, teria que ter amigos, dar satisfação e interagir com outras pessoas. "Eu não gosto de ninguém mandando em mim", diz. "Estou na rua por opção."

Estas reportagens foram produzidas pela equipe do 62º Programa de Treinamento em Jornalismo Diário da Folha, patrocinado pela Philip Morris Brasil.