Às 10h da manhã, Franklin Sousa, 44, dormia havia pouco. "Só durmo de dia, não confio em ninguém", diz ao despertar, enrolado em um cobertor xadrez. Tinha escolhido deitar em um lance de escadas na rua Major Quedinho, próximo à avenida Nove de Julho.
Aprendeu a se manter desperto desde a primeira noite na rua, quando se misturou a outras pessoas no largo do Paissandu. Há dois anos, saiu do apartamento onde vivia com a segunda mulher e o filho que tinha oito anos. "O coração ainda sente", conta.
Começou a usar cocaína aos 19 anos e, durante o casamento, o vício voltou porque não encontrava trabalho. "Ela falou que ia me largar e eu não acreditava. Um dia, resolvi sair de casa." Limpo há mais de um ano, Franklin não teve mais coragem de voltar.
Mesmo com saudade da família, foi na rua que ele conseguiu ficar, de vez, sossegado. "Não gosto de andar com ninguém. Nem com os meus irmãos, quando pequeno, gostava. Prefiro ficar sozinho."
Passou a enviar notícias com mais frequência à família depois que o filho mais velho, de 25 anos, disse que o pai estava morto.
O mais novo precisou ir ao psicólogo para lidar com a perda -e Franklin teve que aparecer para desfazer o mal-entendido. É pelo caçula que de vez em quando chora. "O pequeno é tudo para mim. Ele tem uma cabeça que gente grande não tem", conta.
"Meu futuro é fé em Deus e sair disso. Jogo na Quina e na Mega-Sena desde os nove anos. Sempre o 4, 24 e 23. Aniversário dos meus filhos e do meu pai."
Estas reportagens foram produzidas pela equipe do 62º Programa de Treinamento em Jornalismo Diário da Folha, patrocinado pela Philip Morris Brasil.