Capítulo 9
A final

Favorita e no auge, seleção brasileira goleia e fatura a Jules Rimet

No duelo de bicampeões mundiais contra a Itália, Brasil leva vantagem física e técnica; gol de Carlos Alberto em jogada histórica fecha placar

O capitão Carlos Alberto Torres levanta a taça Jules Rimet após o Brasil golear a Itália - Rolls Press/Popperfoto/Getty Images

O capitão Carlos Alberto Torres levanta a taça Jules Rimet após o Brasil golear a Itália - Rolls Press/Popperfoto/Getty Images

Luís Curro
São Paulo

Domingo, 21 de junho.

Dia da final da Copa de 1970. Estádio Azteca, na Cidade do México, com mais de 107 mil torcedores.

Brasil x Itália. Ao vencedor, a posse definitiva da Taça Jules Rimet.

A seleção brasileira era favorita. Pelo futebol apresentado até então, por ter mais talentos individuais e por a Itália ter disputado uma semifinal extenuante contra a Alemanha, vitória por 4 a 3 na prorrogação —seria difícil suportar bem, fisicamente, o jogo todo.

"Nosso time, naquele momento, não tinha nem mais o que evoluir. A gente estava no auge", disse Carlos Alberto.

Os brasileiros contaram ainda com outros dois trunfos.

O primeiro, estar preparado, com conhecimento tático difundido em treinos e conversas, para suplantar a marcação individual da Itália.

O segundo, a ausência de um dos astros da Squadra Azzurra, Gianni Rivera. O técnico Ferruccio Valcareggi, inexplicavelmente, o deixou na reserva até os 39 minutos do segundo tempo.

Fisicamente, o Brasil sobrou mesmo. Nitidamente, os italianos cansaram no segundo tempo, e o 4 a 1 foi justo.

Mas a vitória não veio sem susto, já que a Itália, em falha clamorosa de Clodoaldo, empatou depois de Pelé ter feito 1 a 0.

Broncas à parte, o volante recuperou-se e brindou a Copa com uma sequência de dribles que iniciaram o último gol do Brasil, do capitão Carlos Alberto, um dos mais bonitos, coletivamente, da história dos Mundiais.

Gerson e Jairzinho —que fez gols em todos os seis jogos, sete no total— haviam marcado antes.

A taça do mundo era nossa.





Carlos Alberto




Fui com tudo, cheguei na passada certa, com a certeza de que iria fazer o gol






Por mais experiência que você tenha, você vai jogar uma final de Copa do Mundo, sempre dá uma dificuldade pra você pegar no sono, isso aí existe. Comigo aconteceu, e tenho certeza de que com outros jogadores aconteceu.

Mas o time estava bem, uma animação muito grande, "e vamos lá, vamos ganhar", aquele clima de brasileiro, aquele clima de Carnaval, samba. E fomos bem pro jogo, sabendo que a vitória viria.

Teve muito samba, pandeiro [na ida ao estádio]. Quem tocava pandeiro era o Gerson, rapaz... O Gerson tocava pandeiro bem. O Brito tocava lá, o Jairzinho tocava o bumbo. Quando chegava no estádio, acabava. Pensamento no jogo.

O Pelé dormia no vestiário, o Pelé tinha esse hábito. Em qualquer jogo, ele ia pro vestiário, pegava um saco de roupa, que servia de travesseiro, ia lá num cantinho, num banco, tirava lá um soninho. Ele apagava, tem gente que tem essa facilidade. E acordava com tudo, né?

A Itália tinha um grande time. Rivera, Mazzola, um puta time. E eles tinham um jogador que, naquele momento, era o grande jogador italiano, o Gigi Riva, canhoto, que tinha uma porrada, chutava pra caramba.

Era o grande jogador italiano da época e daquela seleção. Porém tinha um detalhe. Meses antes da Copa, tinha tido uma contusão séria no tornozelo.
Aí, sem maldade, a gente chegava e falava: "Brito, o cara teve uma contusão séria no tornozelo, dá uma chegadinha junto com ele". Aquela conversa de jogador brasileiro. Aí o Brito procurou, não pra tirar o cara do jogo, mas chegou junto com ele. Aí, o cara: "Opa, peraí".

Isso é recurso do jogador. O jogador que é inteligente procura usar esse expediente pra tirar proveito da presença do adversário. E deu certo. Tanto que o Gigi Riva não foi um problema.

O Pelé tinha uma impulsão excepcional, né? Apesar de ele ser de baixa estatura, tinha uma impulsão que era uma coisa natural dele. Eu imagino o Pelé com os treinamentos que se tem hoje... Pô, ele ia subir no segundo andar aqui do prédio.

Aquele gol trouxe uma tranquilidade pra nós que foi até muito grande, para o Clodoaldo fazer aquele lance de tentar dar de calcanhar e que permitiu o empate deles. E que levou o Clodoaldo a ouvir alguns palavrões. "Pô, Clodoaldo!" [risos]

Nós fomos pro vestiário, o Zagallo deu lá um esporro: "Vamos lá que dá!". Então o time manteve o domínio da partida, o controle do jogo, e as coisas foram acontecendo normalmente. Até que o Gerson fez o segundo gol.

E, depois, não demorou muito tempo não, o Jair errou o chute, o goleiro caiu, esperando uma porrada, e aí a bola foi pingando, pingando e entrou. Aquele gol acabou de dar a tranquilidade que o time precisava pra manter o controle do jogo até o final.

*

O meu gol, eu vou mais ou menos lembrar como é que foi.

Desde o momento em que o Tostão recuperou a posse de bola, ele deu pro Piazza, o Piazza deu pro Clodoaldo, o Clodoaldo deu pro Gerson, o Gerson voltou pro Clodoaldo, aí ele deu pro Rivellino lá na ponta esquerda, o Rivellino lançou lá na frente pro Jairzinho, o Jairzinho tocou pro Pelé, e o Pelé passou pra mim. Então, o que marca até hoje foi a jogada em si.

Esse quarto gol, ele é considerado por muita gente como o gol mais bonito, pela feitura dos passes. Eu chegar ali e dar um chute foi o de menos. Mas foram oito toques, fora os dribles do Clodoaldo, e toques pra frente.

Eu costumo dizer que aquele gol não foi de orelhada, não. Muita gente fala sempre do improviso do jogador brasileiro: "Você apareceu ali". Mas eu sabia que poderia acontecer, senão não ia. Fim de jogo, eu ia ficar lá na defesa descansando.

A preleção foi na noite anterior, na véspera. O Zagallo conversou, mostrou os eslaides, o posicionamento: "Carlos Alberto, pode acontecer essa situação. Se acontecer, você vai [para o ataque]". Aí aconteceu, e sorte que eu me liguei.

O chute, eu cheguei com tudo. Eu fui com tudo porque eu cheguei na passada certa. Eu não chutava forte daquela maneira, mas, quando o cara chega na passada certa, o chute sai mais forte. Muita gente diz que o chute saiu forte porque a bola parece que quicou num montinho. Então ela subiu um pouquinho.

Mas eu acho que o gol sairia de qualquer maneira. Cheguei com a certeza de que iria fazer o gol.

Quem faz um gol numa final de Copa do Mundo, do jeito que foi feito aquele gol, a reação da torcida, a certeza de que aquele gol acabava com qualquer tentativa de reação do adversário, um grande adversário como era a Itália, então, é muito difícil [descrever].

Vou dizer "senti a emoção"... Claro, a emoção todo mundo sente. Mas foi uma coisa que realmente... O time todo festejando, nego invadindo o campo... Então é muito difícil colocar palavras pra descrever... Pô, senti tudo, pô, tudo.

Parece que foi tudo ajeitado: o fato de eu ter feito o gol como capitão e depois de menos de dez minutos estar recebendo a taça, que naquele momento passava a ser de forma definitiva do futebol brasileiro, a Jules Rimet.

Aí eu lembro que quando eu fui lá, no momento em que o cara me deu a taça, recebi e fiquei meio bobo. E o fato de eu ter beijado a taça foi uma coisa, juro por Deus, que veio assim. Me deu uma vontade, sem pensar, de beijar a taça.

Aliás, foi a primeira vez que alguém beijou a taça, e hoje todo mundo faz. Eu fui pioneiro.





Gerson




Você fazer o segundo gol, pra dar um alívio na galera toda... É sopa no mel







No último jogo, contra a Itália, a torcida era a mesma. Embora não fosse com aquela força toda de Guadalajara, mas ainda o estádio a nosso favor.
Nós sabíamos como a Itália marcava. Homem a homem, não por zona, e isso é horrível... É horrível pra quem faz o esquema. Pra quem vai jogar contra é uma teta.

Nós tínhamos um esquema montado pra isso. Aí o que acontece? O Facchetti tá acompanhando? Troca o Jair, vai pra ponta esquerda. O Facchetti veio, realmente está acompanhando.

E ficou aquela abertura, uma avenida muito grande pro Carlos Alberto entrar e sair à vontade por ali. Tanto é que, numa dessas [investidas], o Carlos Alberto fez um gol, tá certo?

Então nós movimentávamos o esquema tático italiano ao bel-prazer nosso, dentro do esquema montado e das variações dentro do esquema.

A conversa [no intervalo] era essa, que nós tínhamos que botar o que nós treinamos pra fora. Porque eles estão jogando exatamente o que nós estamos pensando. Nós é que ainda... Não encaixou? Vamos encaixar. "Gerson, mais lançamento." Pronto.

Eu fazia parte de uma engrenagem. Eu tava ali pra fazer aquela minha jogada. Agora, essa jogada do gol, do meu gol, foi... O Jair, nessa troca que ele fazia pra abrir aquele setor, ele veio do lado esquerdo. Ele veio da esquerda pro meio, e eu entrei pra fazer o corta-luz com ele.

Ele passou e deixou a bola. E levou o marcador. Aí clareou pra mim. Eu ajeitei, mas vi o lateral vindo pra bloquear. Eu bati, mas tirei o pé, tanto é que ele [o italiano] passou aqui [perto]. Se eu deixo o pé, me arrebento todo.

Copa do Mundo é Copa do Mundo. E você fazer um gol, e ainda mais o segundo gol, pra dar um alívio na galera toda... É sopa no mel.

Aí foi o descanso. Dali pra frente, houve mais a saída deles ainda e isso facilitou mais pros lançamentos.

Foi esse lançamento que eu fiz pro Pelé... E ele viu o Jairzinho entrando. E tocou de cabeça pro Jair. O Jair arrumou de barriga pra chutar e errou o chute. E matou o goleiro, porque o goleiro estava no chute dele, não na arrumada dele. E a bola foi, foi, foi e entrou.

Muito bem... E o quarto gol foi... A bola veio da esquerda pra meia direita. O Pelé girou e o Carlos Alberto já vinha correndo lá de trás, naquela avenida. E ele rolou pro Carlos Alberto. O Carlos Alberto deu sorte, porque a bola bateu no gramado e subiu, e ele pegou bem e pronto... Acabou o jogo.

Daí pra frente, eles só pediam a camisa: "Ó, dá a camisa aí. Sua camisa é minha, hein?".





Clodoaldo




Eu deixei a Itália quase que nocauteada para que nós pudéssemos fazer o gol







Assistimos ao jogo da Alemanha com a Itália, houve aquele desgaste das duas seleções. A Alemanha, uma equipe de um nível técnico excelente, como a Itália. A Itália tinha grandes jogadores também, estava muito bem preparada.

Só que eles tiveram um desgaste muito grande. Foram pra prorrogação, num jogo histórico (4 a 3). A Itália saiu vencedora, nós assistimos ao jogo e estudamos muito bem a Itália. Então, nós sabíamos que eles iriam ter um desgaste muito grande no segundo tempo.

A Itália achou aquele gol, numa bola que eu perdi, mas nós percebemos, ao virar o jogo, que a Itália já estava muito desgastada. E voltamos para o segundo tempo impondo nosso ritmo. Aquele jogo de toque, jogo compacto, de agrupamento, até sair o golaço do Gerson. Depois saiu o do Jairzinho, num lançamento do Gerson de quase 60 metros.

E, depois, a jogada: eu driblei uns quatro italianos no meio de campo. Foi uma coisa que a Itália já tava... Eu até brinquei em alguns momentos, e brinco até hoje, que ali eu deixei a Itália quase que nocauteada para que nós pudéssemos fazer o gol que saiu.

E, com a conclusão do quarto gol, o que é que acontece? Final de jogo. Tá 3 a 1, você ainda tá preocupado. Mas, no momento em que saiu o quarto gol, eu lembro que nós começamos a nos olhar. Olhávamos um pro outro com aquela cara de alegria, quase de choro.

Ali deu a certeza da conquista, antes de o juiz apitar. Pô, acabou, pô, campeão, campeão! E nós começamos ali a gritar: "É campeão! Campeão!". E abracei o Rivellino, abracei o Piazza, foi muito legal.

Isso é uma emoção que não dá pra esquecer jamais. Enquanto eu estiver aí com os meus 80 anos, não sei até quando Jesus vai permitir a gente ter essa oportunidade de continuar a nossa missão aqui... Mas é uma alegria inesquecível, uma emoção inesquecível.

*

Eu tive um erro contra a Itália. Claro que pra você explicar pra 90 milhões de brasileiros não dá, né?

Mas eu tive um lance... É como um atacante, quando alguém cruza uma bola pra ele fazer o gol e ele passa da bola. Ele tá além da bola, e ela vem por trás. A única tentativa de esse atacante fazer o gol é ele dar de calcanhar, que é o chamado gol de letra.

Então, na hora em que eu recebi a bola, ela quicou no meu pé. Eu tava saindo da defesa para o ataque, eu não esperava e ela veio. Aí, ele [Boninsegna] percebeu e correu de lado.

Como eu percebi que ela ia passar e ele ia dominar e sair pra fazer o gol, tentei o único recurso que eu tinha. Não é que eu quis enfeitar a jogada, eu tive só aquela oportunidade, de tentar jogar a bola lá na esquerda.

Mas quando eu fiz assim [o movimento] pra dar pro Everaldo, e ela quicou porque estava molhada, ele [Boninsegna] já estava do lado. Se ele estivesse na minha frente, talvez até desse pra tentar dominar.

Eu assumo a responsabilidade. Quando a gente erra, tem que assumir. De qualquer forma, não me abalou. Eu até brinquei, na época, que o presidente Médici tinha dito que o jogo ia ser 4 a 1, e eu falei: "Eu fiz aquela brincadeira lá pro nosso presidente acertar o placar".

Mas tá bom, já passou, graças a Deus. [risos] Muita gente depois lembrava desse lance. Quando fala em Copa do Mundo, tem gente que gosta mais de falar das coisas ruins.

"Ó o Clodoaldo ali. Pô, Clodoaldo, aquele gol da Itália, hein?". E eu falo: "Não lembra do gol da Itália, lembra do gol contra o Uruguai, pô! Lembra dos dribles que eu dei, lembra das coisas boas...".





Tostão




Acabou o jogo, teve a invasão de campo. Tiraram minha roupa, quase eu fico nu







O jogo contra a Itália, a final, foi um jogo muito emblemático, não só porque foi a vitória do título, mas por causa da questão tática. A gente sabia que a Itália jogava fazendo marcação homem a homem e com um líbero atrás, um jogador sobrando.

Então, no jogo com a Itália eu quase não peguei na bola. Participei pouco, individualmente. Foi combinado que eu jogaria em cima do líbero [Rosato] pra não deixá-lo sair na cobertura.

O gol do Gerson. O Gerson dribla e o líbero deveria estar saindo na cobertura pra não deixar o Gerson chutar. Mas não estava. Por quê? Porque ele tava me marcando, eu tava em cima dele.

O gol do Carlos Alberto, o quarto. A jogada tá desenhada, o Carlos Alberto tá entrando sozinho. Normalmente o líbero é quem fazia essa função [de cobertura]. Mas eu fiquei na frente dele, quase que marcando ele.

Quer dizer, foi um jogo também tático, muito tático, uma vitória tática também.

Não foi das melhores partidas da seleção. O primeiro tempo de Brasil e Itália foi igualzinho a Brasil e Inglaterra, durante todo o jogo. Jogo amarrado.
O Brasil não conseguia armar, organizar as jogadas, trocar passes, envolver o adversário como fazia. Porque a Itália marcava demais, homem a homem. E eu lá, quase não pegava na bola porque o time não conseguia organizar as jogadas. Todo mundo marcado.

Quando eu tava indo pro vestiário, quando acabou o primeiro tempo, eu tava com a convicção, falando: "No segundo tempo eles não vão aguentar, eles vão cansar".

Porque dava pra ver, no final do primeiro tempo, nos últimos dez minutos, já dava pra sentir que eles não tavam aguentando mais jogar naquele ritmo.

Então foi um jogo amarrado no primeiro tempo. No segundo, não. No segundo, o Brasil começou a ter facilidade e, depois que saiu o segundo gol, virou um baile. Saiu o terceiro, o quarto e, se tivesse mais jogo, saía mais gol.

Teve aquela festa, acabou o jogo teve aquela invasão de campo, aquele punhado de coisas. Eu fiquei só de sunga. Tiraram minha roupa, quase que eu fico nu.

Eu me lembro do Rivellino, o Rivellino desmaiado dentro de campo... Desmaiado assim, como se estivesse desmaiado dentro do estádio.

Isso eu, como médico, e depois tendo estudado um pouco de psicologia e de psicanálise, uma coisa tem relação com a outra. O jeito de ele se comportar, reclamando de tudo e tal e tal, tem um pouco a ver com esse abalo emocional dele.

Eu fiquei até meio preocupado. Ele deitado no meio da multidão, podia alguém pisar nele.





Piazza




Se eu soubesse dar carrinho, acho que não teria acontecido o gol da Itália







Quando ficou definido a Itália, e da forma como nós passamos pelo Uruguai, chegamos até ali com a quinta vitória, eu, particularmente, sem nenhum tipo de prepotência, de menosprezo, de desrespeito, eu me senti campeão antecipado.

"Não vai ser agora que a gente vai entregar o ouro". A coisa tava muito fixada na minha cabeça. Foi esse o meu pensamento. No fundo, eu falei: "Já me sinto campeão".

Claro que isso não é só individualizado. Você tem que sentir isso do grupo também, essa força.

A gente estava enfrentando a Itália num jogo decisivo, e o Brasil até aquela hora era bicampeão mundial e a Itália também. Então, quando tem esses confrontos, é evidente que você tem que se sentir superior, mas tem que estar preparado.

Você não pode bobear ou acaba perdendo, a exemplo do que aconteceu, infelizmente, com a nossa seleção em 1982 quando enfrentou a Itália.

O que eu acho, com todo respeito aos colegas que foram em 1982... Faltou uma melhor formação tática no meio pra proteção à zaga. Faltou uma consciência mais tática do nosso time.

Tem um detalhe nesse jogo. Se eu soubesse dar carrinho, acho que não teria acontecido aquele gol da Itália, quando o Clodoaldo tentou dar uma chaleira em cima do atacante.

Eu não dava carrinho, eu dava "carroça". Eu sempre fui um jogador que joguei mais em pé. Não sabia dar carrinho. Quando eu fiquei sabendo que ia ser quarto-zagueiro, eu tentava dar, mas era bobagem.

Naquele lance, quando a bola espirrou entre o Boninsegna e eu... Se eu sei dar carrinho, acho que eu cortava aquela jogada. Eu fiquei meio esquisito no tal carrinho e acabou dando em gol.

Eu não esperava que a Itália pudesse empatar daquela forma, naquele momento. Eu não esperava ter que correr atrás. O 1 a 1 não dava o título pro Brasil nem pra Itália, embora o Brasil tivesse feito uma campanha melhor.

Gozado. A gente tava tão acostumado, só vitória, vitória, vitória, que o pensamento ficou só na vitória, que acabou acontecendo de forma maiúscula, graças a Deus.

Naquele momento em que o árbitro encerrou o jogo, todo o mundo estava com o pé em cima da linha do campo. Eu nem ouvi o apito final do árbitro.

Aí já tava aquela galera, aquela multidão toda, eu sabia que eram muitos jornalistas.

Mas, de repente, eu falei: "Como é que esses mexicanos conseguiram chegar até aqui, esse tanto de mexicano? Só voando".

E eu me dei conta daquela confusão, mas ainda assim sobrou espaço pra esse lado emocional. A minha maior emoção não foi eu pensar: "Sou tricampeão mundial". Não foi. A minha foi, realmente, ligada ao sentimento de gratidão ao mexicano.

Então essa vibração, pra mim, bateu forte em termos de retribuição ao carinho do mexicano. De falar assim: "Obrigado, México, porque a casa que a gente teve foi do começo ao fim".

Tanto que hoje, quando jogam Brasil e México, claro que eu quero que seja o Brasil que ganhe, mas quando tem um time mexicano numa competição eu fico torcendo pra ele ir bem. Porque eu fico ligado ainda a esse tempo de 1970. A gente não consegue esquecer. Não consegue.