Há três décadas o Brasil realiza um ambicioso programa de privatizações e concessões de empresas e atividades estatais à iniciativa privada que vem revolucionando a paisagem econômica do país.
No período, os brasileiros contaram com a multiplicação do acesso a serviços essenciais, como telefonia e energia, além de melhor infraestrutura em setores como rodoviário, aeroportuário e financeiro.
O salto dos investimentos privados não apenas compensou, mas ultrapassou várias vezes a capacidade que o Estado tinha –e tem– para ampliar ou atualizar serviços básicos à população.
As privatizações e concessões se deram em todos os governos, desde o lançamento do PND (Programa Nacional de Desestatização), no início dos anos 1990. Elas tiveram maior ênfase nos governos Fernando Henrique Cardoso, Michel Temer e Jair Bolsonaro.
Com a experiência acumulada e contratos mais sofisticados, o programa ganhou um novo capítulo a partir dos anos 2000, com as concessões adquirindo o protagonismo.
Segundo Luiz Chrysostomo, que ajudou a construir o PND e coordenou a privatização da Telebras em 1998, a desestatização no Brasil passou por fases distintas, com mudanças de enfoque ao longo do tempo.
Ela evoluiu das privatizações "puras" iniciais para as concessões, agora combinadas à capitalização de estatais e diluição do capital votante da União, como no caso da Eletrobras.
As maiores privatizações ocorreram entre 1990 e 2000, em especial no governo FHC, quando foram vendidas empresas dos setores de telefonia, siderurgia, extração mineral e bancos.
Cerca de US$ 100,3 bilhões foram arrecadados no período (em valores nominais), segundo cálculos de Fabio Giambiagi, ex-economista-chefe do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), instituição que coordenou a maior parte das privatizações.
A partir de 2001, a venda de estatais diminuiu e deu lugar às concessões e às PPPs (Parcerias Público Privadas), aprovadas no governo de Luiz Inácio Lula da Silva –levando à transferência para a iniciativa privada de rodovias e aeroportos, entre outros ativos.
Com a criação do PPI (Programa de Parcerias de Investimentos), no governo Temer, as concessões aceleraram e, com Bolsonaro, houve rodada de transferência de ativos e diluição de capital, além de concessões.
Segundo o Ministério da Economia, foram arrecadados US$ 46 bilhões com a venda de participações em estatais e empresas, como a BR Distribuidora e a TAG (Transportadora Associada de Gás), além de ações da Petrobras, Vale e JBS, entre outras. As concessões e parcerias por meio do PPI somaram mais US$ 32,8 bilhões.
"A arrecadação desses valores é muito significativa. Mas mais importante é a interrelação e o impacto que os investimentos privados geram, até em termos de inovação, em toda a economia, que ficou mais eficiente e dinâmica", diz Pedro Capeluppi, secretário especial de Desestatização, Desenvolvimento e Mercados do Ministério da Economia.
Apesar do enxugamento, o Brasil ainda tem 47 estatais sob controle direto do governo federal, que empregam 445.972 funcionários. Em 2021, o gasto com pessoal atingiu R$ 116,1 bilhões, com muitas remunerações mensais superando R$ 100 mil, além de participações generosas nos resultados e planos de aposentadoria e saúde muito superiores aos da iniciativa privada.
Uma série de reportagens da Folha detalha em seis capítulos as privatizações e concessões dos últimos 30 anos em rodovias, telefonia, energia, aeroportos, empresas e bancos públicos –e os desafios para tornar os serviços ainda mais acessíveis e baratos à população.