A história da arte brasileira, principalmente a escrita a partir do eixo Rio-São Paulo no calor dos anos 1960, parece se misturar com a trajetória desse artista.
Presente em exposições antológicas na construção dessa narrativa visual e amplamente estudada por pesquisadores e outros artistas, sua obra investiga a tênue vibração das formas e dos materiais através de objetos e instalações configuradas como truques para o olhar.
Sua seleção para a 33ª Bienal, a mostra "Os Aparecimentos", é antes de tudo uma curadoria de sua própria poética. Praticamente metade das obras mostradas na exposição são suas, como as das séries "Olhos D"Água" e "Orquestra".
Sobre a fundamentação de seu projeto, Caldas afirma exercer três atividades correlatas –"a do artista que realiza uma obra, a do artista que tem preferências e a de um terceiro que pensa a relação
entre os dois anteriores".
"Assim, eu posso tratar essas questões como gostaria, sem torná-las discursivas, colocando sob suspeita as justificativas e teorias estéticas", acrescenta o artista.
Um dos trabalhos que melhor sintetiza todo esse projeto é "Rodtchenko", pequeno objeto vermelho criado por Caldas em referência ao artista construtivista russo.
Ocupando discretamente uma parte do terceiro andar do pavilhão, esses trabalhos são mostrados em um ambiente amplo, permitindo que muitos deles sejam observados simultaneamente.
O espaço é limpo e austero, um deleite para as linhas e formas minimalistas dos trabalhos selecionados pelo artista-curador, em sua maioria históricos e consagrados.
"Visto que a produção de um artista trata de inúmeras questões que variam ao longo do tempo, escolhi obras que desviam do que mais se conhece de cada um deles e se destacam por seu valor e especificidade. O resultado da relação entre as peças escolhidas passou a ser o principal interesse desta seleção", diz.
As obras vão de objetos mais familiarizados com o conceitualismo formal de Waltercio Caldas, como as esculturas do espanhol Jorge Oteiza e dos brasileiros Sergio Camargo e José Resende, a pequenas pinturas ou gravuras de seus mestres pessoais, como Vicente do Rego Monteiro e Oswaldo Goeldi.
Juntas, as peças percorrem um arco temporal que vai do século 19 até os dias de hoje.
Outros artistas presentes nesse recorte (todos homens) têm obras que dialogam com maior ou menor intensidade com a poética de Caldas –o americano Bruce Nauman, os brasileiros Miguel Rio Branco e Antonio Dias, o britânico Anthony Caro, o italiano Antonio Calderara, entre outros.
A despeito de a exposição se abrir como uma imersão ímpar na poética de um artista da importância e do frescor de Waltercio Caldas, seu gesto curatorial parece reclamar um estado anterior.
Seu discurso às vezes parece sobrevalorizar a simplificação das formas e a autonomia da linguagem, algo que pode soar refratário a interpretações e contingências que agora entram em colisão com uma ideia de pureza da arte.