A Escola Estadual Ítalo Betarello, na zona norte de São Paulo, ocupou em 2016 o primeiro lugar na capital no Idesp , exame que avalia o desempenho das escolas paulistas no ensino médio.
O diretor da unidade de 1.550 alunos, 65 professores e alguns vidros quebrados, Ariovaldo Guinther, vez por outra procura feirantes na Ceagesp para recolher alimentos que sobram no entreposto para vender perto da escola.
"É uma espécie de mercado. Com menos recursos disponíveis, não podíamos ficar de braços cruzados", diz.
Segundo colocado no REE-F (Ranking de Eficiência dos Estados - Folha), São Paulo tem os melhores indicadores de educação do levantamento. Na área de finanças, que indica o equilíbrio das contas públicas, é o terceiro melhor, atrás de Ceará e Pernambuco.
Mas o secretário de Planejamento, Maurício Juvenal, diz ser "inevitável" nova renegociação da dívida de São Paulo. "Se não, ela beira se tornar estratosférica."
A partir de 2016, 18 estados fecharam acordos com a União para alongar R$ 460 bilhões em dívidas por 20 anos.
Em Santa Catarina, primeiro colocado no REE-F, o secretário da Fazenda, Paulo Eli, admite que não entregará o governo em dezembro cumprindo a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) por causa de contas atrasadas em várias áreas.
Em dois anos, diz, é provável que o estado não tenha mais recursos para sustentar seu déficit previdenciário.
No Amapá, último colocado no REE-F e com indicadores ruins em infraestrutura e segurança, a Polícia Militar chegou a atuar recentemente com cerca da metade do efetivo regular de 7.500 homens.
"É a pior fase desde que entramos. Não há policiamento preventivo, só reativo", diz o secretário da Segurança, José Carlos Souza.
Independentemente da posição de cada um dos 26 estados no ranking da Folha, todos têm algo em comum: já entraram, estão próximos ou caminham na direção do colapso ou da falta de recursos para áreas básicas.
Na raiz do problema está o peso da folha de pagamento de servidores ativos e inativos, que consome cada vez mais fatias das receitas disponíveis.
Frente às dificuldades, o REE-F revela que os estados que mantêm ou ampliaram sua base industrial e de serviços no PIB (Produto Interno Bruto) são os mais bem posicionados, já que essas atividades geram mais receita.
Os que têm a agricultura, a administração pública ou repasses da União como principais fontes de receitas se saem pior no quesito eficiência.
Santa Catarina, São Paulo e Paraná, os três primeiros colocados e eficientes, têm na indústria e nos serviços aproximadamente 70% do PIB. Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Tocantins, Rondônia e Rio Grande do Sul, com maior peso relativo da agricultura, são todos "pouco eficientes".
Como o REE-F revela o retrato de uma longa trajetória de administrações (os partidos das três últimas estão indicados no ranking), e não apenas o da presente, pesa também sobre os estados, além de boas ou más gestões, o histórico de cada um deles.
Santa Catarina, por exemplo, tem a base industrial mais diversificada do país, com 51 mil unidades bem espalhadas.
Fruto da atividade de imigrantes, sobretudo de alemães e italianos, as indústrias sustentaram uma alta de 4,2% do PIB estadual em 2017, ante 1% na média nacional.
"Com pouco mais de 1% do território do país, temos o quarto maior PIB e o segundo maior movimento em portos", diz Glauco José Côrte, presidente da Fiesc (Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina).
Pernambuco também persegue há mais de uma década o aumento da participação industrial em seu PIB. No período, deixou para trás a dependência no setor sucroalcooleiro, atraiu dezenas de indústrias e uma refinaria no complexo do porto de Suape, além de uma fábrica da Fiat Crysler no norte do estado.
Quarto colocado no REE-F e primeiro no Nordeste, Pernambuco se destaca pela melhora na educação (tem a menor evasão e é o 1º no Ideb, empatado com São Paulo) e por uma situação fiscal equilibrada. Seu ponto fraco é a segurança, entre as piores do país.
"Na saúde, houve quebra de preconceito e quatro novos hospitais foram abertos em parceria com Organizações Sociais [OSs] privadas", diz Márcio Stefani, ex-secretário da Fazenda.
Esse tipo de arranjo em busca de mais eficiência passa pela contratação de entidades sem fins lucrativos, as OSs, para gerir unidades públicas mediante remuneração paga pelos estados.
Embora exista desde 1998, ele tem sido adotado só mais recentemente em estados como Pernambuco e Amapá, mas está presente em São Paulo nos últimos 20 anos.
Dos 98 hospitais sob a responsabilidade do governo paulista, 43 são geridos por OSs, além de mais de 60 ambulatórios médicos de especialidades, as AMEs.
Nas análises do REE-F, o desempenho na saúde mostra forte correlação com a eficiência, especialmente a mortalidade infantil. Já mais inclusão no ensino médio revela menor taxa de homicídios.
No caso da influência por atividade econômica, a mesma relação entre indústria e serviços fortes e eficiência foi observada no REM-F (Ranking de Eficiência dos Municípios - Folha), de 2016, que levou em conta oito variáveis nas áreas de saúde, educação, saneamento e finanças em 5.281 cidades (95% do total).
Agora com 17 variáveis agrupadas em seis categorias (saúde, educação, infraestrutura, segurança pública, finanças e receita per capita), o REE-F revela que um quinto (19%) dos estados brasileiros pode ser considerado eficiente -proporção próxima à dos municípios (24%), segundo o REM-F.
Para a sorte de muitos brasileiros, os cinco estados "eficientes" (SC, SP, PR, PE e ES) agrupam 37% da população. O total sobe para 67% quando somada a população de outros seis estados com "alguma eficiência" na gestão (PB, MG, PI, CE, RJ e GO).
Entre eles, o Rio de Janeiro é o terceiro mais populoso (atrás de SP e MG) e provavelmente o mais problemático.
Historicamente entre os estados mais importantes do país, sua base antiga de escolas, hospitais e infraestrutura o sustenta no grupo dos com "alguma eficiência" e em décimo lugar no ranking.
Mesmo assim, o Rio aparece como o pior do Sudeste, sobretudo por indicadores ruins em segurança e finanças -quesito em que é, disparado, o pior colocado.
Com endividamento mais de duas vezes superior à receita, o Rio chegou a decretar estado de calamidade pública em 2016 às vésperas das Olimpíadas, atrasou salários por 18 meses e teve que fechar um acordo de recuperação fiscal com a União, no qual terá seis anos para tentar equacionar suas contas.
"Enquanto podia, o Rio resolveu gastar toda a sua receita de royalties do petróleo com funcionários públicos e aposentadorias. Quando ela caiu, o estado quebrou", diz José Márcio Camargo, economista da PUC-RJ.
Já o secretário da Fazenda do estado, Luiz Cláudio Gomes, culpa a recessão de 2015-16 e a crise na cadeia de óleo e gás. "Vivemos uma tempestade perfeita", afirma.