Brasil só perde para os EUA em tempo de visualização de vídeos on-line
DANIELA PINTÃO
DA EDITORIA DE TREINAMENTO
A cada minuto são geradas 500 novas horas de conteúdo no YouTube mundial. Não se sabe quanto dessa produção é brasileira. O Google, dono da plataforma, não divulga dados regionais, mas informa que o país ocupa o segundo lugar mundial em tempo de visualização de vídeos on-line, atrás apenas dos EUA.
Chamados de criadores pelo YouTube e de influenciadores digitais pelo mercado (que inclui também instagramers, facebookers e afins), os produtores de conteúdo digital cresceram em número e fama; muitos ganharam status de celebridade.
O fenômeno ganhou força por aqui há três anos, e sua curva continua ascendente. Segundo a Rede Snack, rede multiplataforma de canais reconhecida e homologada pelo YouTube, há cerca de 310 mil canais de vídeo on-line no país.
O Google não confirma o número, mas parece não haver dúvida de que o Brasil é peça importante desse tabuleiro. Na lista dos 100 canais mais influentes do mundo, 24 são brasileiros, segundo o ranking de outubro (último dado disponível) da Snack Intelligence/Tubular Labs. No ranking dos que mais faturam, porém, as webcelebridades nativas nem aparecem.
O país ocupa também o segundo e o terceiro lugares na lista, com Whindersson Nunes e Felipe Neto. No topo das duas listas, reina o gamer e comediante PewDiePie, sueco que se apresenta em inglês e faturou US$ 15 milhões em 2016.
Whindersson, piauiense de 21 anos, ultrapassou neste ano o Porta dos Fundos em número de seguidores; seu canal tem mais de 14,7 milhões de inscritos e mais de 1 bilhão de visualizações.
Os canais de humor são populares, mas outros tipos de conteúdo que não costumam ocupar a programação da TV também ganharam espaço. O Manual do Mundo, sobre ciência, experimentos e curiosidades, tem mais de 7 milhões de inscritos e 1,2 bilhão de visualizações. O canal de game RezendeEvil, voltado principalmente ao jogo Minecraft, tem mais de 9 milhões de seguidores e superou os 3 bilhões de visualizações (leia perfis).
Um dos fatores responsáveis pelo sucesso é a popularização dos smartphones, que já respondem por mais da metade (55%) das horas dedicadas a vídeos na internet, conforme pesquisa encomendada pelo YouTube.
O mesmo estudo revela que o tempo médio gasto com essa atividade duplicou no Brasil nos últimos dois anos, saltando de 8 horas/semana para 16 horas/semana. O percentual de brasileiros que passa mais tempo vendo vídeos on-line do que em outras mídias saltou de 12% para 30%.
O levantamento, de julho, ouviu 1.500 brasileiros entre 14 e 55 anos que assistem regularmente à televisão. A amostra representa 61% da população brasileira, com margem de erro de dois pontos percentuais.
Outro fator importante é o modo de funcionamento da plataforma. "Como o YouTube oferece uma enorme variedade de canais e conteúdo, o espectador não fica preso à programação fechada e aos horários que a TV impõe. Ele pode assistir quando for mais conveniente e a partir de diferentes dispositivos", afirma Fábio Utumi, 48, sócio-diretor da IQ Agenciamento, pioneira no gerenciamento de carreira de youtubers no país. É a mesma lógica que faz, por exemplo, o sucesso do Netflix.
OUTROS MUNDOS
Os números expressivos ajudaram a catapultar os influenciadores além das fronteiras do mundo digital: eles produzem e encenam peças de teatro e shows de stand-up, fazem filmes, lançam livros e licenciam produtos como caderno, camiseta, capa de celular e até dois álbuns de figurinhas.
Um desses álbuns, parceria da Panini (a maior empresa do ramo de figurinhas no mundo) e da agência brasileira Digital Stars, foi lançado em julho deste ano com uma tiragem inicial de 2 milhões de pacotes de figurinhas. Foi o primeiro do gênero no mundo.
Além de aumentar a exposição, são essas atividades extras a maior fonte de renda. O ganho com publicidade é mais relevante quando o criador negocia diretamente algum tipo de ação, seja em eventos seja embutida em seu vídeo (merchandising, por exemplo). Nesses casos, o faturamento é todo dele.
Já as propagandas exibidas antes dos vídeos são captadas pelo Google, e o criador recebe centavos de dólar por exibição. O valor é variável e depende de critérios que a empresa não revela (veja infográfico nesta página), mas a soma só é significativa para os muito famosos. O youtuber recebe quando acumula um mínimo de US$ 100. Caso não alcance o montante em um mês, os centavos vão sendo somados até atingir a cifra.
ONIPRESENTES
Ainda que se dediquem mais a uma determinada rede social, os criadores costumam estar presentes em todas. Os fãs acompanham a vida do ídolo em postagens que vão do frequentemente irrelevante ao absolutamente pessoal.
Em outubro passado, Kéfera contou no Snapchat que sua tia estava com câncer terminal. Sem maquiagem, chorando, com os olhos inchados e o nariz escorrendo, encarnava duas das características mais prezadas pelos seguidores: ser "autêntico e verdadeiro".
Em junho, PC Siqueira, um dos pioneiros no país, gravou vídeo mostrando o resultado da cirurgia que lhe corrigiu o estrabismo, até então sua marca registrada; contou que havia sofrido bullying a vida inteira, que estava se sentindo mais bonito e com a autoestima mais alta após a mudança. Teve mais de 2,5 milhões de visualizações.
A exposição da vida particular e de sentimentos universais aproxima fãs e ídolos, criando a percepção de "gente como a gente". A suposta horizontalização também alimenta o anseio de que qualquer um pode ser como eles. Em princípio, não é necessário mais que um smartphone e acesso à internet para ter um canal, e os próprios criadores estimulam seus seguidores a produzir conteúdo.
São poucos, no entanto, que atingem os patamares mais altos. PC Siqueira afirma que a primeira geração de youtubers era muito experimental e se arriscava na plataforma. A segunda, que atualmente faz sucesso, profissionalizou-se e sabe que existe uma carreira a ser seguida. Quem está começando agora valoriza fama e audiência e acaba deixando a autenticidade de lado e se aproximando da linguagem televisiva, diz.
"O que me amedronta é que as próximas gerações de youtubers se tornem cada vez mais celebridades, a ponto de a internet promover um novo distanciamento entre fãs e ídolos."