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A história que a rua escreveu

No Rio de Janeiro, locais de origem do samba passam despercebidos

A esquina da Pedra do Sal, no Rio, antigo mercado de escravos e um dos lugares importantes na história do samba Ana Carolina Fernandes - 19.jun.15/Folhapress
A esquina da Pedra do Sal, no Rio, antigo mercado de escravos e um dos lugares importantes na história do samba

LUIZA FRANCO
DO RIO

Quem chega ao tradicional samba de segunda-feira da Pedra do Sal, região portuária do Rio, ouve, antes de qualquer samba, o Bob Marley da barraca de caipirinha e os sons das várias línguas faladas pelos turistas. O cheiro de maconha se mistura com o açúcar das bebidas.

Só depois disso tudo chega-se ao pé da pedra, onde o mesmo grupo toca, há anos, sambas de Candeia, Noel Rosa, Bide, Marçal. Nas últimas décadas do século 19, quando a pedra era referência para os baianos que chegavam no Rio, o cheiro provavelmente vinha dos quitutes das baianas, e o som, do batuque, talvez vindo de um rancho carnavalesco, talvez de um ritual de candomblé.

A experiência de estar na Pedra do Sal pode ter mudado um bocado, mas fato é que o "point" é um dos mais vivos lugares de memória das origens do samba na cidade, o que não se pode dizer de outros lugares que pesquisadores consideram tão importantes quanto.

"O samba não era restrito ao centro e à zona portuária, foi um fenômeno de subúrbio também. Tudo aconteceu ao mesmo tempo", diz o pesquisador Luiz Antonio Simas, que escreveu, com Nei Lopes, o "Dicionário da História Social do Samba".

Quem procurar hoje os lugares onde a história do samba começou vai dar com a cara em algumas portas, procurar endereços que sumiram do mapa ou chegar a lugares que não dão pinta da importância histórica que tiveram. Herivelto Martins e Grande Otelo alertaram no samba "Praça Onze" (1942): "Vão acabar com a praça Onze/ Não vai haver mais escola de samba, não vai". As escolas estão aí, mas resta quase nada do lugar que era o epicentro da chamada

Pequena África, varrida pela construção da avenida Presidente Vargas, aberta em 1944.

Foi posta abaixo a casa de Tia Ciata, quituteira, macumbeira e matriarca do samba. Lá foi composto, há cem anos, o primeiro samba registrado, "Pelo Telefone". Pixinguinha, Donga, João da Baiana e Heitor dos Prazeres ouviram lá as tradições musicais baianas que dariam uma forma nova, carioca, como conta o pesquisador Roberto Moura, no livro "Tia Ciata e a Pequena África no Rio de Janeiro".

No Estácio, centro do Rio, sambistas como Ismael Silva, Bide e Marçal cunharam na década de 1920 o termo "escola de samba", porque brincavam que eram professores do gênero. Hoje Silva é lembrado em uma estátua e no nome de um conjunto do Minha Casa Minha Vida.

Cerca de 20 quilômetros a noroeste dali, no bairro Oswaldo Cruz, a casa de Dona Esther, líder espiritual dos primeiros portelenses, está de pé, com um plaquinha que a identifica. As festas ali chegavam a durar uma semana, diz seu sobrinho, seu Mirinho, 86. Paulo da Portela frequentava o lugar anos antes de fundar a escola.

Dizem que Jair do Cavaquinho, da Velha Guarda, perdeu o emprego porque passou três dias lá, e que Natal, o bicheiro patrono da escola, foi pedir socorro a ela depois de matar uma pessoa. Pixinguinha, Cartola e Donga também iam ao baile da matriarca.

Na Mangueira, a casa de Carlos Cachaça não tem placa. Já a de dona Zica, mulher de Cartola, pelo menos, tem.

"As crianças das escolas aqui perto não sabem nada da história do samba que floresceu ali do lado delas. Elas aprendem a história oficial, que tem viés do colonizador, que não fala dessa cultura negra, que foi renegada historicamente, e dá nisso", diz a pesquisadora do Museu do Samba, Desiree Reis.

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