Parto

Espaço e despreparo dificultam ampliação do parto humanizado

BRUNA DE QUEIROZ
PRISCILA BELLINI

DA EDITORIA DE TREINAMENTO

Foram 16 horas desde a entrada da pedagoga Elizani Branco Lima, 30, na casa de parto, até o momento em que ela deu à luz o pequeno Davi. Sem anestesia, a mãe gritou de dor inúmeras vezes, mas ganhou massagens e tomou banho na banheira.

O parto aconteceu na Casa Ângela, zona sul de SP, uma das duas casas de parto municipais na cidade. Tem salas confortáveis e seis quartos, que dão privacidade à mulher e ao acompanhante na preparação e na hora do parto. Juntas, elas realizam até 50 partos gratuitos por mês.

Elizani foi acompanhada pelo marido e por uma doula, acompanhante de parto que oferece apoio físico e psicológico à gestante, durante todo o processo -e pela reportagem da Folha.

Ela teve a opção de ficar de pé, deitada, agachada ou andando antes do parto. Escolheu não receber medicamentos que induzissem o nascimento. Elizani gritou sem ser repreendida pelos profissionais da Casa.

A liberdade que Elizani teve é uma das principais características do que se convencionou chamar de "parto humanizado". No parto humanizado, as decisões da mulher são respeitadas, se não apresentam risco ao bebê ou à gestante.

A prática é recomendada pela OMS (Organização Mundial de Saúde). Na capital paulista, seus preceitos deveriam ser praticados em toda a rede municipal de saúde, após sanção de lei pelo prefeito Fernando Haddad (PT) em 2013.

As práticas, porém, não são totalmente cumpridas, reconhece o próprio governo.

A enfermeira obstetra e professora da USP Marlise de Oliveira Pimentel Lima afirma que em muitos casos a mulher não tem liberdade para se movimentar no quarto durante o trabalho de parto.

Marlise, que atua na rede municipal, diz também que muitos dos procedimentos são feitos sem que a mulher seja ouvida. É o caso da ruptura artificial da bolsa ou do uso da ocitocina, hormônio que acelera o parto.

O coordenador municipal do Programa de Saúde da Mulher, o médico Adalberto Kiochi Aguemi, afirma "que há problemas".

O representante da prefeitura diz que os médicos não tiveram formação adequada para cumprir o que se preconiza atualmente no parto humanizado. "A gente não é treinado para outras posições que a mulher queira", afirma.

Aguemi diz também que a própria estrutura das maternidades é problemática. "O espaço físico é limitado e está sobrecarregado." A situação dificulta a locomoção das gestantes, por exemplo.

MELHORIAS

A professora da USP e o coordenador da prefeitura dizem que, se por um lado há muito o que melhorar, a rede já avançou nos últimos anos, principalmente após a aprovação da lei de 2013.

Uma das medidas tomadas foi aumentar o número de partos sob responsabilidade de enfermeiras obstetras e obstetrizes, consideradas menos intervencionistas do que os médicos obstetras.

Eles representavam 70% dos trabalhos em 2014, e agora são 72%.

Quando se busca quantificar a presença do parto humanizado, uma das taxas mais observadas é a de episiotomia, o corte no períneo para passagem do bebê. O número caiu de 18% em 2014 para 13% em 2015. A média nacional é de 53% dos partos.

Não há um indicador único que sintetize todas as práticas do parto humanizado, mas existem índices como o parto em posições alternativas, presença de acompanhantes e uso de ocitocina.