Pai tem que participar

Presença ativa do pai favorece habilidades da criança, dizem estudos

Raquel Cunha/Folhapress
O designer Vitor Goersch com a filha Laura, de 2 meses

FÁBIO TAKAHASHI
DE SÃO PAULO

Um pai presente não apenas alivia a sobrecarga da mulher. Ele também aumenta as possibilidades de a criança alcançar melhores resultados cognitivos e emocionais ao longo do tempo, indicam pesquisas recentes.

O problema é que muitos pais não estão tão presentes, também mostram pesquisas.

Nos últimos anos, a ciência passou a estudar mais o impacto do envolvimento paterno no desenvolvimento infantil. Até a década passada, o interesse esteve mais presente na relação mãe-filho.

Crianças no Reino Unido com pais participativos no primeiro ano de vida apresentaram mais vocabulário aos dois e três anos do que aquelas que não contaram com os cuidados paternos mais diretos quando bebês. Essa foi a conclusão de um amplo estudo de 2013 realizado pela OCDE (organização dos países desenvolvidos), que acompanhou 20 mil crianças.

Nos Estados Unidos, crianças que chegaram à pré-escola com mais habilidades de leitura e matemática eram as que contaram com pais participativos no primeiro ano de vida, identificou a mesma pesquisa, que acompanhou por seis anos o desenvolvimento das crianças.

O trabalho da OCDE apontou que os ganhos foram mais robustos quando os pais, além de se envolverem em atividades como trocar fralda, leram para os filhos e fizeram brincadeiras com eles.

Trabalho da Universidade de Montreal, de 2012, que revisou pesquisas sobre o tema, lembra o papel do pai para explicar os resultados sempre positivos nesses estudos. Segundo o texto, o pai incentiva o filho a "se abrir ao mundo", a se aventurar e a se "levantar sozinho".

"O homem mostra à criança valores e visão diferentes dos da mulher", diz a professora de psicologia social Elizabeth Barham, da Universidade Federal de São Carlos (SP). "Os ganhos ocorrem quando o pai complementa, e não substitui a mãe."

Pesquisa feita por Barham com cem famílias no interior paulista sugere que crianças com pai presente no cotidiano têm menos problemas de comportamento na escola.

Do ponto de vista da psicanálise, afirma o professor da PUC-Rio Cesar Ibrahim, a função paterna é impor limites.

"Não pode cuspir na vovó, não pode assistir TV o dia todo. O responsável pela função paterna deve mostrar isso. Sem a delimitação, haverá recusa às regras e à aprendizagem quando a criança crescer", diz o psicanalista. Ibrahim pondera que essa função pode ser exercida pelo pai ou por outra pessoa do convívio da criança.

Raquel Cunha/Folhapress
O designer paulistano Juca Orlandi prepara a filha Alice, 4, para a aula de balé
O designer paulistano Juca Orlandi prepara a filha Alice, 4, para a aula de balé

ROCK E BALÉ

O interesse dos pesquisadores pelo impacto do envolvimento paterno no desenvolvimento da criança cresceu depois de as mulheres se consolidarem no mercado de trabalho -forçando os maridos a participar mais da vida dos filhos do casal.

A divisão de atividades é feita, por exemplo, na casa do designer paulistano Juca Orlandi, 37, sócio da mulher. Com mais flexibilidade em suas funções na empresa, sobrou para Juca levar Alice, 4, ao balé. O que não é tão simples para um ex-integrante de banda de rock de garagem.

"As roupas que escolho para ela às vezes são sem noção. O penteado é um caso à parte. O coque teve de ser refeito pela professora na aula."

Outras funções não são tão desafiadoras. Ele está presente também nas brincadeiras diárias com Alice e na leitura na hora de dormir. "Tenho medo de ser pai que não faz ideia do que se passa na cabeça dos filhos."

Coordenador do núcleo de desenvolvimento infantil da Universidade Federal de Santa Catarina, Mauro Luis Vieira afirma que "o envolvimento paterno cresce, mas o caminho ainda é longo".

Segundo ele, há pais que continuam vendo a criação do filho como coisa de mãe, "e outros se retraem, por não saberem como agir ou por serem inibidos pela mãe".

Levantamento nacional realizado com mais de 2.000 pessoas pelo Ibope e a Fundação Maria Cecília Souto Vidigal identificou no tema uma contradição entre a situação ideal e a real.

Enquanto 92% dos pesquisados concordaram com a afirmação de que o pai deve participar ativamente da criação dos filhos, apenas 47% das mães disseram que eles estavam sempre presentes. A discrepância é semelhante nas diferentes classes sociais.

No caso do advogado Gabriel Sister, 36, a saída foi mudar a rotina de trabalho. As funções numa empresa multinacional permitiram atuar algumas vezes de casa, depois que nasceram os filhos (hoje com dois e quatro anos). "Não queria ser pai restrito aos fins de semana e feriados."

"Eu nem gosto quando perguntam se eu ajudo a minha mulher. Ajudar dá uma cara de falta de comprometimento. Quero estar envolvido com tudo", afirma o designer Vitor Goersch, 32, pai de uma menina de dois meses. O fato de trabalhar em casa ajuda. "Troco fraldas, passeio com ela, tento acalmar quando chora. Para isso preciso estender o trabalho até de madrugada algumas vezes, até porque minha mulher também é autônoma e não ganha nada nessa licença. Mas vale a pena."

O homem mostra à criança valores e visão diferentes dos da mulher. Os ganhos ocorrem quando o pai complementa, e não substitui a mãe.

Elizabeth Barham, professora de psicologia social da Universidade Federal de São Carlos (SP)