A 'pior empresa aérea' do mundo é experiência singular na aviação

JOHANNA NUBLAT
ENVIADA ESPECIAL A PYONGYANG
Parte da experiência de ir à Coreia do Norte é embarcar na empresa aérea estatal, a Air Koryo, que opera alguns voos curtos internacionais em aeronaves russas (em variantes do Tupolev 204) e ucranianas (Antonov 148).
Na internet, a primeira referência à Air Koryo é sua classificação como "a pior companhia aérea do mundo", por ser a única listada com apenas uma estrela pelo site Skytrax, que avalia serviço e conforto —a Latam e a Gol receberam três estrelas, de um máximo de cinco.
Estrangeiros que lidam com turismo na Coreia do Norte veem a classificação como "boba e inverídica" e dizem que houve modernização na frota para voos internacionais, operados hoje em aviões de até oito anos.
"[A classificação] é lançada pelo Skytrax e gera alguma publicidade para eles. Possivelmente eles façam isso atrás de risadas, já que [a avaliação] difere dos comentários de passageiros no site. De toda forma, não é justa", avalia Simon Cockerell, da agência Koryo Tours, em Pequim, que leva cerca de 2.000 pessoas por ano ao país.
Não há registros de acidentes fatais desde 1983. Em julho, um voo de Pyongyang a Pequim fez um pouso de emergência em Shenyang após a presença de fumaça na cabine. Ninguém se feriu, mas a China cobrou mais treinamento e manutenção.
A reportagem da Folha embarcou em dois voos da Air Koryo, ambos no Tupolev 204, no trecho entre Pequim e Pyongyang, em setembro.
Os passageiros são recebidos com revistas e jornais norte-coreanos (com opção em inglês) e comissárias sorridentes que falam inglês.
Na classe econômica —também há a opção executiva—, o espaço para as pernas não difere do que se vê num voo brasileiro. Mas a poltrona do Tupolev reclina consideravelmente mais.
Não há mapa de voo; no lugar dele, as televisões que descem to teto passam concertos norte-coreanos e solenidades com pessoas fardadas.
A cabine é bem conservada e faz um pouco de calor.
Quem tem medo de voar pode se assustar em dois momentos: no barulho de algo quebrando quando descem e sobem as rodas, e quando a cabine de comando faz avisos sonoros (um forte "pan").
Em 1h20 de um voo tranquilo, foram oferecidos um hambúrguer empanado adocicado como lanche, iogurtes e um refrigerante lilás.
Os turistas, que compõem boa parte do voo, aproveitam para entrar no clima do passeio e tirar selfies, apesar do veto às fotografias no avião.
Já os norte-coreanos, identificáveis pelos broches com as fotos dos líderes no peito, e aqueles que fazem comércio despacham inúmeros pacotes —só um viajante despachou dez volumes (160 kg).
AVIÕES VINTAGE
A frota da Air Koryo inclui, ainda, uma coleção de aviões soviéticos, que não fazem rotas internacionais, mas atraem aficionados por aviação. Há, inclusive, tours específicos para esse público.
"A Air Koryo tem um lugar no coração dos entusiastas da aviação devido a continuar operando uma frota clássica, mantida de forma imaculada. Alguns modelos, como o Ilyushin IL-18 e o IL-62, só estão em atividade na Coreia do Norte e, como são consideradas lendas da indústria da aviação, têm muito apelo", diz David Thompson, da Juche Travel Services, baseada no Reino Unido.
A internet está cheia de fotos e relatos de estrangeiros que participaram dos tours da aviação norte-coreana, descrevendo barulhos de motores e as cabines vintage.
Além da Air Koryo, que faz a maioria dos voos para Pyongyang, é possível embarcar em um voo da Air China ou viajar de trem —neste caso, um trajeto que leva 25 horas saindo de Pequim.