Análise

Na China, sistema financeiro e mercado de capitais são inovadores, mas frágeis

Notas de yuan em banco de Beijing, na China Kim Kyung-Hoon/Reuters
Notas de yuan em banco da capital chinesa Beijing

RODRIGO ZEIDAN
ESPECIAL PARA A FOLHA

A economia chinesa é cheia de paradoxos. Em que outro lugar do mundo se pode ministrar um curso de educação para executivos de um fundo de "venture capital" estatal com US$ 15 bilhões de capital?

Mais do que isso, como a empresa é estatal, todos os funcionários da empresa foram obrigados a assistir minha aula, como se estivessem no primário.

Qual a principal reclamação dos executivos do fundo? Os dados das empresas em que estavam investindo ou queriam investir não eram confiáveis.

Ou seja, em um fundo estatal de investimento em novas empresas, com elevado risco, o maior deles era a corrupção local, que resultava em manipulação de dados de balanço.

"Venture capital" estatal é quase uma contradição em termos. Somado à desconfiança nos dados básicos, isso mostra como existe uma linha tênue entre crescimento econômico e eficiência.

O exemplo acima mostra algumas das características peculiares do sistema financeiro chinês: é um dos mais robustos, inovadores e frágeis do mundo.

É um dos grandes motores do crescimento chinês, mas, diferente do brasileiro, é muito menos regulado do que se esperaria de um mercado emergente.

O desenho do sistema chinês é simples: é aberto à competição interna, mas isolado do resto do mundo. Os bancos comerciais no país são em sua maioria estatais, mas empresas privadas (a Tencent, por exemplo) podem competir em diversos segmentos do mercado dominados pelos bancos estatais.

Além disso, os bancos regionais, diferentes dos brasileiros do passado, competem de verdade, e não são somente veículos de financiamento dos governos locais.

O sistema de gestão de riscos chinês é do século 20, com controles internos que permitem fraudes de desenho animado, como funcionários saindo de bancos com maletas cheias de dinheiro ou agências que descontam duplicatas de milhões de dólares de empresas de fachada.

Ao mesmo tempo, há uma explosão de empresas inovadoras na área financeira, as chamadas "fintechs".

Enquanto no Brasil as empresas do ramo assinam manifesto para tentar se integrar ao sistema financeiro, muito regulado pelo Banco Central, na China há autorregulação e as empresas são livres para se integrar ao sistema e oferecer soluções mais sofisticadas.

Um exemplo é o pagamento de contas pelo celular por meio de autenticação de digitais e empréstimos via WeChat, a versão local do WhatsApp -sim, na China é possível pegar empréstimo por aplicativo de conversa de celular.

Não há desenvolvimento sem sistema financeiro. No Brasil, a busca por segurança gera ineficiência e uma das maiores taxas de juros do mundo.

Na China, por outro lado, o crescimento do crédito assusta. Enquanto nos últimos 20 anos a relação crédito/PIB (Produto Interno Bruto) no Brasil subiu de 54% para 70%, ela explodiu no país asiático, saindo de 86% em 1996 para mais de 220% hoje em dia.