NA TV (OU INTERNET)

Elétrico e atual, drama sobre hackers 'Mr. Robot' é estreia do ano (por ora)

LUCIANA COELHO
COLUNISTA DA FOLHA

No dia 1º de julho de 2015, um operário da Volkswagen na Alemanha foi morto por um robô que ajudava a montar. No dia 8 daquele mês, a movimentada Bolsa de Nova York parou por mais de três horas por um problema técnico sem explicação. No dia seguinte, o governo dos EUA anunciou que hackers roubaram de seu banco os dados de 21,5 milhões de pessoas.

Não há aparente correlação entre os incidentes. Mas, em um mundo viciado em algoritmos, essa pequena lista mostra quão iminente é a premissa de "Mr. Robot", drama sobre um hacker envolvido em uma conspiração para arrasar a economia global que o canal americano USA estreou nos EUA.

Como parte da estratégia de promoção, o episódio piloto havia sido divulgado no festival SXSW, em março, e na internet no final de maio. Atraiu tamanha atenção que garantiu o contrato da segunda temporada antes de a primeira chegar à TV.

O feito se torna maior porque Sam Esmail, o egípcio de 37 anos que concebeu a série, nunca tivera um contrato anterior na TV. "Mr. Robot" é um bom thriller de ficção científica, que ganha outra dimensão graças ao forte estofo social (estamos no terceiro episódio, mas a premissa e o ritmo não dão sinal de que vão arrefecer).

Esmail, que voltou para visitar sua terra natal logo após a Primavera Árabe (2010-11) e gosta de falar sobre política em entrevistas, soube dar voz –na altura certa– à geração do "Occupy Wall Street".

Para balizar o idealismo e dar-lhe ar mais maduro, misturou às críticas a governos e corporações um olhar corrosivo sobre a bolha de individualismos e autopromoção que as redes sociais na internet criaram. O monólogo do protagonista sobre aparências e solidão no primeiro episódio é tão pungente que ecoa outro texto definitivo de sua geração, o de "Trainspotting" (1996).

A matriz é a mesma: a impossibilidade de se fazer escolhas diante do que a sociedade demanda. Se em "Trainspotting" o problema era o consumo, em "Mr. Robot" são as personas sociais que criamos. O herói, Elliot (o também egípcio-americano Rami Malek), é um jovem engenheiro de segurança cibernética que sofre de ansiedade social e cujo hobby é hackear a vida alheia.

Cínico no último grau, ele forma sua concepção dos outros apenas com as informações que divulgam nas redes sociais –não aquelas pensadas para emitir felicidade, mas as que escapam nas entrelinhas e comentários, quase sempre refletindo vazios. Em uma boa sacada, o roteiro usa o Facebook como vilão e ferramenta para contar a história.

A vida de Elliot segue uma rotina tão bem demarcada que até para se drogar ele cria limites controlados. Até o dia em que é abordado pelo Mr. Robot do título (o ex-galã Christian Slater), o líder anarquista de uma organização de hackers subterrânea que, obviamente, tem um plano maior para a humanidade.

Edward Snowden curtiu isso.

MR. ROBOT
DIREÇÃO Sam Esmail, Jim McKay
ELENCO Rami Malek, Christian Slater, Portia Doubleday
PRODUÇÃO EUA, 2015
ONDE seg., às 21h, no Space
AVALIAÇÃO ótimo