Médico sugere terapia, mas professor de história prefere abrir bar de rock
Keiny Andrade/Folhapress | ||
O professor Manfredo Kolya, 48, no bar de rock em Itapevi (SP) que reabriu após diagnóstico da doença |
LETÍCIA NAÍSA
DA EDITORIA DE TREINAMENTO
"Se eu tivesse câncer, seria mais fácil entender o que eu tenho", diz o professor de história Manfredo Kolya, 48. Quem o vê fumando na porta de seu bar, na cidade de Itapevi (SP), não imagina que ele foi diagnosticado com outra doença grave, a esclerose múltipla, em março de 2015.
Kolya é um ponto fora da curva: a patologia atinge principalmente mulheres brancas em idade fértil. "Eu imaginei que fosse algo relacionado a demência, essa era minha preocupação", conta.
Antes de entender a doença, ele temia não reconhecer o rosto de sua esposa, Nanci Kolya, 49, dos três filhos, e do neto. Depois do diagnóstico, descobriu que se trata de uma doença autoimune, ou seja, que seu corpo pratica uma espécie de autossabotagem, e que não tem cura. No caso da esclerose múltipla, o sistema imunológico ataca o sistema nervoso central.
O tipo de esclerose múltipla que Kolya tem é o mais comum, chamado de recorrente-remitente. Isso significa que seus sintomas, como fadiga, tontura e visão turva, vão e voltam. "Tenho vários dias não bons e outros bons", diz.
Pensando nos dias "não bons", sua esposa sugeriu que ele reabrisse o Expresso Rock Bar –um espaço de rock que tiveram por um ano e meio. Fecharam em 2012, diz, por sobrecarga de trabalho. Nessa época, Kolya dava aulas nas redes pública e privada de ensino.
Foi por conta da correria que ele ignorou os primeiros sintomas da esclerose múltipla. Achou que a tontura, o cansaço e a visão dupla fossem sinais de labirintite e automedicou-se. Em poucos dias, melhorou.
Três anos depois, os sintomas voltaram mais fortes e ele não conseguiu andar da cama até o portão de casa. Kolya foi levado ao hospital com suspeita de AVC. Depois de 21 dias de exames e consultas, a ressonância magnética possibilitou o diagnóstico de esclerose múltipla.
Desde que descobriu a doença, foi afastado das escolas onde lecionava e passou a cuidar da logística do bar reinaugurado em outubro do ano passado.
Kolya foi aconselhado a procurar ajuda psicológica quando recebeu o diagnóstico, mas se recusou porque não queria tomar mais remédios. Hoje, faz acompanhamento semestral com um psiquiatra e chama seus clientes de terapeutas. "Se eu pagar alguém toda semana para contar minha vida, vai ser tedioso", diz Kolya, que trabalha recebendo os clientes e dando informações na porta do bar.
Nos últimos anos, sua mobilidade piorou e ele não consegue caminhar mais do que 50 metros sem se cansar. Por isso, ano passado comprou um triciclo, que é muito mais prático do que um carro, diz. Kolya usa o triciclo para viajar, ir à padaria e repor o estoque de bebidas do bar.
Ano que vem, Kolya precisa renovar sua habilitação e teme perder o direito de conduzir o triciclo. "A esclerose múltipla me tirou dois prazeres: dar aula e dirigir", diz. "Gostaria de parar de fumar também, mas a doença já me tirou tanta coisa", lamenta enquanto acende mais um cigarro.