O que é

Sintomas somem durante a gravidez por queda do sistema imunológico

Keiny Andrade/Folhapress
Temas - SAO PAULO - 01.08.2017 - ESPECIAL ESCLEROSE - FOLHA TREINAMENTO TREINEE - Retrato de Paula Kfouri, 34, ex-empresária, com Joao, seu filho. Ela tem 34 anos e foi diagnosticada com esclerose múltipla aos 22. Está há seis anos sem sintomas da doença e sem surtos. Tem um filho de 1 ano, o João, que pretende amamentar até ele completar 2 anos. Foto: KEINY ANDRADE/FOLHAPRESS
A empresária Paula Kfouri, 34, mãe de João, 1, na sua casa em São Paulo

LETÍCIA NAÍSA
DA EDITORIA DE TREINAMENTO

As vítimas mais comuns da esclerose múltipla são as mulheres em idade fértil. A doença atinge as mulheres duas vezes mais do que os homens e a média de idade para seu aparecimento é aos 30 anos.

As razões para a prevalência maior entre as mulheres ainda são desconhecidas pela ciência, mas o mesmo fenômeno acontece com outras doenças autoimunes, como lúpus. No caso da esclerose múltipla, o sistema imunológico passa a funcionar de maneira inadequada, atacando o sistema nervoso central e provocando lesões no cérebro e na medula, que causam sintomas como fadiga extrema, visão turva, fraqueza e problemas cognitivos.

Essa situação muda durante a gravidez. Na gestação, há uma queda natural na atuação do sistema imunológico para evitar que o feto seja encarado e atacado como um corpo estranho. Engravidar funciona quase como um tratamento temporário para a doença, segundo a neurologista Patricia K. Coyle, da Universidade de Stony Brook, em Nova York.

A técnica em logística Cíntia Campos, 40, tinha dores no corpo, fadiga e falhas de memória e teve que se afastar do trabalho. O diagnóstico de esclerose múltipla recebido em 2013 fez com que ela desistisse da ideia de ter filhos. Em março deste ano, se descobriu grávida; está com 18 semanas de gestação. "Com o decorrer da gravidez, estou melhorando", conta a santista.

Segundo especialistas, ao contrário do que se pensava há décadas, não existe contraindicação para as mulheres que têm esclerose múltipla e desejam engravidar. Frequentemente, a melhora dos sintomas dispensa a continuidade do tratamento medicamentoso durante a gravidez.

Para Coyle, é uma questão de escolha da paciente e do médico. Ela afirma que existem duas substâncias que podem ser seguras para uso durante um período inicial da gestação: interferon beta e acetato de glatirâmero, dois medicamentos imunomoduladores que têm evidências de não serem prejudiciais.

O alívio temporário não afasta, porém, outras angústias. A mineira Bianca Azevedo, 37, desistiu de ser mãe depois do seu diagnóstico em 2015 e está na espera do SUS para colocar um DIU (dispositivo intrauterino, método anticoncepcional inserido no útero). "Não tenho o direito de colocar uma criança no mundo sem saber qual futuro eu vou poder dar a ela", diz.

A apreensão de Bianca com o futuro é bastante comum no consultório. "As pacientes temem piorar e não poder cuidar da criança", afirma a neurologista Maria Cecília de Vecino, coordenadora do centro de esclerose múltipla e doenças desmielinizantes do Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre.

Outra dúvida recorrente é relativa ao pós-parto. Com o fim da gestação, o sistema imunológico volta a funcionar normalmente, trazendo a possibilidade do retorno dos sintomas. A medicação usada para evitar os surtos –cortisona ou imunoglobulina– são fortes e não há consenso de que a amamentação seja segura para a criança.

O Ministério da Saúde diz que não existem dados suficientes na literatura médica para saber se a prática pode ser livre de riscos e recomenda não amamentar.

Sem sintomas há seis anos, a empresária paulista Paula Kfouri, 34, parou de tomar os remédios quando engravidou e não voltou a eles desde então. Ela aposta numa mudança de alimentação e estilo de vida para poder amamentar o filho João, 1, até ele completar dois anos. "Alguma coisa me diz que amamentação também protege a mim e ao meu filho de alguma forma", diz. "Nenhum médico me disse isso, mas é minha escolha."