O que é doping

Substâncias proibidas são usadas para trapacear, mas também por desatenção

IGOR UTSUMI
DE SÃO PAULO

O canadense Ben Johnson se tornou um dos atletas mais populares do século passado depois de competir na Olimpíada de Seul, em 1988. Nos Jogos, ele superou o astro americano Carl Lewis, venceu a medalha de ouro nos 100 m rasos e quebrou o recorde mundial da prova.

O auge da popularidade, porém, não veio por causa da glória esportiva, mas por uma palavra complicada: estanozolol. A substância, detectada em exame antidoping realizado pelo atleta, é um esteroide anabolizante, ajuda no ganho de massa muscular e melhora a performance dos esportistas. Foi também responsável por tirar a medalha, o recorde e a vitória de Ben Johnson.

A palavra "doping" geralmente é associada a casos como esse, em que um atleta toma ou injeta alguma substância para ter uma vantagem em relação aos oponentes, mas o significado é mais amplo.

Em 2013, Hugo Parisi, brasileiro dos saltos ornamentais que estará nos Jogos Olímpicos do Rio, foi suspenso por três meses depois que um teste acusou o uso de substância proibida pela Wada (Agência Mundial Antidoping).

Nada que melhorasse seu desempenho nas piscinas. Após uma ida ao médico para tratar uma inflamação na garganta, usou Prelone, um corticoide com efeito anti-inflamatório. Acabou impedido de disputar o Campeonato Mundial de Esportes Aquáticos em Barcelona naquele ano.

Hugo Parisi, atleta brasileiro dos saltos ornamentais, nos Jogos Pan-Americanos de 2015 (Foto: Rob Schumacher/USA TODAY Sports)

Embora inusitado, casos de doping acidental não são raros. Atletas não podem usar muitas drogas receitadas por médicos para tratamentos de doenças, sob o risco de serem pegos. Analgésicos a base de isomepteno (como Neosaldina), remédios para hipertensão a base de clortalidona (como Higroton) e anti-inflamatórios, como o usado por Hugo Parisi, são alguns exemplos.

Segundo Ivan Pacheco, diretor da SBMEE (Sociedade Brasileira de Medicina Esportiva) e membro da comissão médica da ABCD (Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem), a solução para esses casos é obter um medicamento com efeito semelhante, mas sem a substância proibida.

"Na ABCD recebemos com relativa frequência pedidos de isenção de corticoide, por exemplo, que é uma maravilha para aliviar a dor, mas tem o uso proibido", afirma. "Como substituto, os atletas podem tomar Voltaren ou Cataflam, que têm mesmo efeito"

Caso o medicamento seja imprescindível, uma isenção para uso terapêutico pode ser dada.

"Há casos necessários, mas precisam ser olhados um por um. É a exceção, porque seguem uma série de requisitos", afirma Pacheco.

LISTA PROIBIDA

O uso de qualquer substância presente em uma lista atualizada e publicada anualmente pela Wada (Agência Mundial Antidoping) leva o atleta a julgamento. A punições que vão desde uma simples advertência até o banimento do esporte.

Essas substâncias estão divididas em 15 grupos principais. Algumas não podem ser utilizadas em nenhum momento, como os agentes anabolizantes que causaram a ruína de Ben Johnson. Outras só acarretam em punições se detectadas durante as competições, como estimulantes, que ajudam o atleta a se sentir mais disposto e concentrado.

Nessa lista, encontram-se também métodos ilícitos, técnicas que podem dar uma vantagem considerada injusta, mesmo sem que algum medicamento ou hormônio seja utilizado.

É o caso do doping sanguíneo, popular até a década de 1980 entre atletas de provas de resistência, como ciclistas e maratonistas.

Os atletas armazenavam o próprio sangue meses antes das provas. Às vésperas da competição, reinjetavam o que estava guardado para aumentar o número de glóbulos vermelhos na corrente sanguínea e otimizar o transporte de oxigênio pelas células. A técnica só foi proibida em 1985, e desde então saiu gradativamente de moda.

A simples tentativa de burlar o exame já configura doping. Um dos casos mais curiosos ocorreu com Michelle Smith de Bruin, nadadora irlandesa que conquistou três medalhas de ouro nos Jogos Olímpicos de Atlanta, em 1996.

Em 1998, ela foi suspensa por quatro anos ao tentar adulterar uma amostra misturando bebida alcoólica à urina coletada. Segundo o relatório do COI (Comitê Olímpico Internacional), a amostra tinha uma concentração de álcool "incompatível com o consumo humano" e "um cheiro forte de uísque".