Técnicos gringos

Do vous habla português?

DE SÃO PAULO

Quem vê o pequeno menino de olhos puxados, carinha de japonês, pode estranhar ao ouvir seu nome: João. O filho de Yuko Fujii, no entanto, é a síntese de uma empreitada que deu certo.

A mãe, japonesa, decidiu aceitar o desafio de se mudar para o Brasil para ajudar a treinar a seleção brasileira de judô. Mesmo sem falar uma palavra de português.

Yuko é um dos 56 treinadores de 20 países diferentes que estavam trabalhando com atletas do país até o fim deste mês. A maior parte deles devem ir aos Jogos do Rio.

Essa legião é fruto de uma estratégia adotada pelo COB (Comitê Olímpico do Brasil) em parceria com as confederações olímpicas de tentar maximizar as chances de medalha do país em casa.

"Quando recebi o convite, fiquei honrada, porque gosto muito da equipe brasileira. Minha família e meu marido aceitaram. Ele veio junto", diz Yuko, que antes treinava a equipe britânica.

"Gostei mais do Brasil. Na Inglaterra, foi mais duro, as pessoas eram mais frias. Aqui, cheguei e já estava cheia de amigos", afirma.

Para conseguir se comunicar, começou a fazer aulas de português pagas pelo COB.

"Ajudamos alguns com aulas do idioma. É engraçado como muitos foram pegando expressões locais. O Jesus [Morlan, técnico da canoagem] me chama de 'meu rei', aprendeu com os atletas baianos do time", afirma Jorge Bichara, gerente geral de performance do COB.

Os estrangeiros trabalham em 30 modalidades. Atletismo (sete), seguido de vela e esgrima (5 cada um) são as que mais usam gringos. Os técnicos atuam tanto no Brasil quanto fora. O maior grupo vive em São Paulo: 20.

"Em geral, não tivemos muitos problemas de adaptação. O mais difícil talvez tenha sido o coreano do tiro com arco [Lim Heesk que não está mais na seleção] por questões culturais", diz Bichara.

Comandante da equipe brasileira masculina de polo aquático, o croata Ratko Rudic, 68, mistura inglês, espanhol e italiano, idiomas dos países por onde passou dirigindo equipes, em um bate-papo. Seus jogadores na equipe nacional, porém, entendem bem sua língua.

Sob sua batuta, o Brasil ficou em inédito terceiro lugar na Liga Mundial de 2015 e obteve prata no Pan de Toronto. O time chegará ao Rio com sonho de ir ao pódio.

Jean-René Mounie, do tênis de mesa, lembra-se bem do choque. Além das questões de língua e do dia a dia, o francês teve de se adaptar à forma como o brasileiro encara o esporte.

"O primeiro desafio foi me adaptar a outra mentalidade. Ter a capacidade de escutar, mas também a convicção suficiente para propor as ideias que eu achava fundamentais para fazer com que a seleção evoluísse. Felizmente, gosto de observar", diz.

"Do ponto de vista profissional, acho que o maior desafio foi definir uma identidade para a nossa seleção, pôr valores que escolhemos acima de tudo. E fazer valer para jogadores e técnicos os valores e regras que colocamos."