7 A 1, um ano depois

Entrevista

"Não se explica o inexplicável", diz Parreira

PAULO PASSOS
EDITOR-ASSISTENTE DE 'ESPORTE'

Ao lado de Luiz Felipe Scolari, Carlos Alberto Parreira viu do banco de reservas do estádio Mineirão a maior derrota da seleção brasileira em Copas do Mundo.

Coordenador técnico da equipe, o treinador diz não ter entendido ainda o que aconteceu no Mineirão, no dia 8 de julho de 2014.

"Não sei, vai demorar muitos anos para entendermos o que aconteceu. Não é uma coisa tangível", afirma Parreira, em entrevista à Folha.

Apesar disso, ele aponta pelo menos dois fatores responsáveis pelo fracasso no Mundial. Um retrato do atraso do futebol brasileiro? Falha ao escalar Bernard como substituto de Neymar? Não, nada disso. Para Parreira o descontrole emocional dos jogadores foi preponderante para a goleada. Excesso de expectativa em relação a um time que disputou o Mundial também levaram ao fracasso, segundo ele.

"Durante um ano surfamos naquela vitória para a Espanha na Copa das Confederações. Não digo que enganou, mas exagerou nessa expectativa", admite Parreira, que na apresentação da equipe na Granja Comary, duas semanas antes da estreia na Copa, declarou: "O campeão chegou!".

Folha - O Futebol brasileiro vive uma crise? Que crise é essa?

Carlos Alberto Parreira - Sim, não é segredo. Mas não existe receita mágica. São fundamentos que deixaram de ser feitos. Acho que estamos analisando de um modo geral equivocado. Nós queremos colocar na seleção todos os problemas do futebol brasileiro. É exatamente o contrário. A seleção é o ápice da pirâmide. O problema está abaixo e isso respinga na seleção ou não. Houve momento em que as coisas não iam bem abaixo, mas a seleção conseguia ser diferente porque tinha uma geração muito boa, alguns fora de série. Queremos resolver com a seleção um problema maior. É tudo muito complexo, temos que ter paciência. Como os alemães fizeram. Em 12 anos eles implementaram um projeto para ganhar uma Copa do Mundo. E ganharam, mas antes perderam. Aqui não temos essa paciência. Precisamos aprender, planejar, projetar resultados.

O que ficará guardado na sua memória da Copa de 2014?

Colocamos muitas coisas, responsabilidades na conta do futebol. O Brasil já foi campeão e os problemas do país não mudaram. Futebol é a paixão, mas não muda nada na vida das pessoas. O que ficou para mim e para o torcedor foi uma tristeza muito grande. Era o sonho de ganhar a Copa em casa, mas não conseguimos. Não ter acontecido era aceitável, mas do jeito que foi não. Agora isso não pode paralisar o nosso futebol. A expectativa foi muito grande. Assumimos, eu e o Felipão, 18 meses antes da Copa do Mundo e as coisas funcionaram até o Mundial.

Funcionaram, mas não houve testes porque não jogamos as eliminatórias. Sofremos por não ter eliminatórias. É um torneio que é importantíssima. A Copa América mostrou isso. Essa rivalidade, paixão, guerra. Isso tempera jogador, mostra quem tem febre. Ele aprende a receber a pressão, a superar. O time da Copa não teve essa vivencia. Fui o treinador que mais disputou eliminatórias. É difícil pra cacete. Ir jogar na Bolívia, no Equador, Argentina, Chile. A Venezuela que era fácil, hoje é difícilFicamos 40 anos sem ganhar no centenário no Uruguai, por exemplo. O time da Copa jogou cinco partidas de competição, na Copa das Confederações.E aquilo (vitória contra a Espanha) não digo que enganou, mas exagerou a nossa expectativa. Mas a comissão técnica também se enganou?Talvez tenhamos exagerado as expectativas também. O jogo da Espanha foi uma apoteose. Esse era o time a ser batido. Vinha de 50 jogos sem perder. Ganhamos no Maracanã. Durante um ano surfamos nessa vitória, consubstanciadas nos resultados de jogos amistosos. Durante 1 ano, ganhamos bem várias partidas. Perdemos para a Suíça, mas foi uma exceção, com jogadores sem treinar. Foi como ocorreu comigo em 2006. Foi assim depois daquele 4 a 1. Um ano depois as coisas mudam. Na Copa do Mundo não tivemos o mesmo ritmo. Seria muito mais palatável se não fosse o 7 a 1 e depois o 3 a 0 Vai ficar marcável, é indelével. Mas temos que construir algo com isso.

O 7 a 1 é a maior derrota do futebol brasileiro...

[Interrompe]..Não sei, vai demorar muitos anos para entendermos o que aconteceu. Não é uma coisa tangível.E tem como dizer o que deu errado?Com certeza algo deu errado. Nervosismo, uma responsabilidade de ter que ganhar. Houve descontrole emocional, sim. Se o nome é descontrole, apagão, não interessa. Era um time que não estava acostumado. É o que já falei, de não ter disputado eliminatórias.

Que imagem o senhor tem da derrota, o que se falava no vestiário após o jogo?

É claro que eu tenho tudo guardado, mas não vou ficar contando.

É verdade que o senhor pediu no intervalo para o time segurar, para não tomar 10 a 0?

O que acontece no vestiário, não se fala.

Mas não existe outra explicação. É só nervosismo? Não houve uma formação errada do time?

Explicar? É difícil. Eu gosto de estudar mercado de ações. Comparo com a crise de 2008. Me lembro da queda das bolsas em 2008. É de um dia para outro. Não dá tempo de fazer nada. Caiu e bum. Foi assim. Foram quatro gols num período de tempo ali que não tinha o que fazer depois. Mas temos que mudar de tema. Não podemos só ficar falando do 7 a 1...

Mas o senhor não acredita que é importante entender porque uma derrota tão vexatória. Ela não explica o momento atual do futebol brasileiro?

Vai demorar muito tempo para entender de uma maneira total, fria. Não adianta. Me lembro de uma cena depois do jogo. Sempre depois da partida, a seleção precisa escolher um jogador para falar com a televisão. O Rodrigo Paiva (então assessor da seleção) perguntou quem ele levava. Realmente, não sabia quem poderia ser. Pensei no Júlio César, que é um cara experiente. Eu pensei: só tem um jogador, é o Júlio César. Ele foi muito bem na entrevista. Não se explica o inexplicável. É isso!

Houve descontrole emocional, sim. Se o nome é descontrole, apagão, não interessa. Era um time que não estava acostumado com decisões"