CASO PC, 20 ANOS DO CRIME

Fotógrafo conta como fez, há 20 anos, imagem do corpo de PC Farias

DE SÃO PAULO

Em 23 de junho de 1996, o repórter fotográfico Juca Varella saiu de Brasília num jatinho fretado rumo a Maceió. Naquele dia, o tesoureiro de campanha de Fernando Collor à Presidência, Paulo César Farias, e sua namorada, Suzana Marcolino, tinham sido encontrados mortos numa casa de praia, com um tiro no peito cada um.

Varella chegou à noite à capital alagoana. No IML, onde os corpos estavam, espremeu-se na entrada com outros repórteres e fotógrafos. Até que teve a ideia de dar a volta no casarão onde funcionava o instituto médico legal.

Após passar por um matagal, chegou aos fundos do prédio. Viu duas janelas encobertas por um plástico preto, sendo que, num deles, havia uma fresta. Por essa fenda, fez uma das fotos mais importantes de sua carreira, como ele mesmo classificaria depois.

No dia seguinte, a Folha publicou em sua capa a fotografia do corpo de PC Farias numa mesa usada para a necrópsia.

Então ombudsman do jornal, Marcelo Leite criticou a publicação: "É difícil defender a foto. A imagem é pouco nítida, mas permite perceber que o corpo de PC estava nu e que um funcionário manipulava um instrumento perto de sua cabeça. Não tem informação relevante para o caso."

"Provavelmente, muitos jornalistas dirão que fiquei maluco e que o furo teria de sair de qualquer jeito. Pois que digam. Se um ombudsman não partir em defesa de princípios, ninguém mais o fará. Não há limites dados e fixos entre o que é moral e imoral, ético ou antiético, mas isso não suprime o ônus de traçá-los, caso a caso", escreveu.

O ombudsman ainda anotou: "A Folha sempre foi um jornal que tenta puxar essa faixa de variação mais para perto de si (publicar tudo). Por outro lado, é o único grande diário que aceita discutir publicamente suas decisões editoriais. Para alguns, pode parecer pouco. Quem conhece as redações brasileiras sabe que não é".

Duas décadas depois, o jornalista mantém a mesma posição crítica à publicação da foto –"e não ao fato de ela ter sido feita pelo Juca Varella", pondera. "Minha opinião hoje é em caráter pessoal, não vale o mesmo que valia na posição institucional de ombudsman."

Segundo ele, em sua coluna de 30 de junho de 1996, "talvez tenha faltado explicitar o princípio que estava em conflito com o baixo conteúdo informativo da foto: a dignidade da pessoa (morta, no caso)". "Nem mesmo um personagem pernicioso para a vida nacional como foi PC Farias merece ser exposto dessa maneira degradante, nu", afirma.

Juca Varella-24.jun.1996/Folhapress
Corpo de PC Farias é examinado por funcionário no Instituto Médico Legal de Maceió
Corpo de PC Farias é examinado por funcionário no Instituto Médico Legal de Maceió

"Já a outra foto em questão, do casal na cama, constitui um documento diretamente relacionado com o interesse público do caso, a saber, a elucidação de um crime que pode ter motivações políticas –como esmiuçaram inúmeras reportagens da Folha e de outros órgãos de imprensa, a posição dos corpos, da arma, a altura de Suzana, o ângulo dos tiros, as manchas de sangue etc. foram questões cruciais nesse debate. O cadáver pelado de PC, não."

Atual editor de "Poder", o jornalista Fábio Zanini diz que publicaria a foto por dois motivos. "Foi um grande furo do fotógrafo Juca Varella, uma informação exclusiva que ninguém mais teve. Quando a imprensa tem em mãos algo assim, tão poderoso, tem que ser publicado."

Para ele, a imagem de PC Farias sendo examinado e preparado para o enterro em Maceió traz sim informações relevantes. "A preparação do corpo e o enterro foram eventos noticiosos importantes em Alagoas", afirma.